Abacate

O abacateiro (Persea americana) é uma árvore originada do México e naturalizada no Brasil, que pertence à família Lauraceae. No Brasil, é cultivado principalmente em Estados das regiões Sudeste e Sul, em plantações abertas (Klein et al. 2020).

Polinização por animais

As flores do abacateiro são hermafroditas, ou seja, possuem as estruturas sexuais femininas e masculinas na mesma flor. Porém, como o estigma – estrutura da parte feminina da flor – não está receptivo quando o pólen da mesma flor é liberado das anteras – estrutura da parte masculina da flor – a autopolinização não ocorre, sendo essencial a ocorrência de polinização cruzada para a formação de frutos (Klein et al. 2020). E para entender essa demanda por polinização cruzada é preciso entender o comportamento de floração do abacateiro.

Em cada árvore, as flores abrem primeiro como femininas (com estigma receptivo e anteras fechadas), depois fecham e, numa segunda abertura, abrem apenas como masculinas (com anteras abertas e estigma não receptivo). Esse comportamento é chamado de dicogamia protogínica, pois, além da maturação sexual das estruturas femininas e masculinas não ser sincronizada (dicogamia), as flores florescem primeiro como femininas (protoginia).

Todas as variedades de abacate apresentam essa característica de dicogamia protogínica, porém elas são divididas em dois grupos (A e B) quanto à abertura das flores ao longo do tempo. Nas variedades do grupo A, as flores abrem primeiro como femininas pela manhã, fechando-se no fim da manhã ou no início da tarde. No dia seguinte, essas mesmas flores abrem como masculinas pela tarde. Nas variedades de abacate do grupo B, as flores abrem como femininas no início da tarde do primeiro dia de floração. Ao entardecer, as flores fecham e reabrem como masculinas na manhã do dia seguinte (Stout 1933; Klein 2020).

Na prática, para que ocorra a formação de frutos, é necessário o plantio de pelo menos uma variedade de cada grupo (A e B) no mesmo pomar, que floresçam juntas, para que existam flores masculinas e femininas maduras sexualmente no mesmo período do dia, assegurando, assim, a polinização cruzada. Por exemplo, duas variedades que podem ser plantadas juntas são a Hass e a Fuerte, pois, enquanto a primeira é do grupo A, a segunda apresenta flores que se comportam como o grupo B. Outras variedades que pertencem ao grupo A são Fortuna e Ouro Verde e ao grupo B, Geada, Quintal e Margarida (Stout 1933; Donadio 1995; Duarte 1998).

O quadro abaixo mostra a sequência de abertura das flores do abacateiro para variedades dos grupos A e B. Para que a polinização cruzada seja bem sucedida – transferência do pólen (que contém o gameta masculino) da antera para o estigma da flor de outro abacateiro do pomar – é essencial que existam flores femininas e masculinas maduras sexualmente no mesmo período do dia. Observe que, pela manhã, há flores femininas da variedade do grupo A disponíveis para receberem pólen das flores masculinas da variedade do grupo B. Alternativamente, no período da tarde, são as flores femininas do grupo B que estão receptivas e podem receber o pólen das flores masculinas do grupo A.

Grupo da variedade de abacateiro Dia 1 Dia 2
Manhã Tarde Manhã Tarde
A Abertura como flor feminina Flor fechada Flor fechada Abertura como flor masculina
B Flor fechada Abertura como flor feminina Abertura como flor masculina Flor fechada

 

O abacateiro é um cultivo altamente dependente de polinização cruzada para a fecundação das flores e necessita da visita de animais polinizadores para gerar frutos. Por ser altamente dependente de polinização cruzada, se toda uma plantação de abacateiros fosse isolada e suas flores não recebessem visitas de seus polinizadores, haveria uma redução de 81% na produção de abacates (Malerbo-Souza et al. 2000; Giannini et al. 2015). Ao visitarem as flores, os polinizadores realizam a transferência de pólen entre os diferentes indivíduos do pomar – o que garante a fecundação e, logo, a formação do fruto.

Abelha africanizada Apis mellifera em flor de abacate red
Crédito: Darclet Teresinha Malerbo de Souza

Visita das abelhas

Diferentes insetos – abelhas, besouros, borboletas, formigas, moscas e vespas – visitam as flores do abacateiro para a coleta de pólen e néctar. Entretanto, a abelha-africanizada (Apis mellifera) é a mais frequente nas flores e se comporta como um polinizador. Outras duas espécies de abelhas sem ferrão, a arapuá (Trigona spinipes) e a jataí (Tetragonisca angustula), também polinizam, embora sejam menos frequentes que a abelha-africanizada nas flores do abacateiro (Malerbo-Souza et al. 2000; Giannini et al. 2020).

Os períodos de floração e colheita do abacate ocorrem durante o ano todo, porém apenas em algumas semanas em cada região. As variedades mais cultivadas são: Antilhano, Bertanha, Breda, Emor, Fortuna, Fuerte, Geada, Guatemalense, Hass, Herculano, Linda, Margarida, Ouro Verde, Paulista, Pollock, Princesa, Quintal, Simmonds Solano Wagner, Waldin e Westin (Klein et al. 2020).

Ganhos para os dois lados

Dado que a produção de abacate é altamente dependente da participação de abelhas, é essencial que o agricultor adote práticas amigáveis a esses polinizadores para mantê-los na propriedade (veja as melhores práticas abaixo). Além disso, também é recomendada a instalação nos pomares de duas colmeias de abelha-africanizada por hectare, principalmente naqueles de maior escala, para um melhor rendimento do cultivo. Foi identificado que as abelhas podem levar o pólen de uma árvore para outra em um raio de até 2 Km, mas, para uma polinização cruzada bem sucedida, a orientação é que as árvores das diferentes variedades sejam plantadas no máximo a 100 m de distância uma da outra (Donadio 1995).

O uso de colmeias da abelha-africanizada para a polinização dos pomares tem crescido entre os produtores de abacate, sendo uma ótima oportunidade para o estabelecimento de parcerias com apicultores, que podem alugar suas colmeias e gerar renda alternativa. Inclusive, o abacateiro disponibiliza néctar para a abelha-africanizada (Malerbo-Souza et al. 2000), permitindo que o apicultor também obtenha renda com a colheita do mel de abacate. Além de ser uma fonte de néctar, o abacateiro também disponibiliza pólen (Malerbo-Souza et al. 2000), podendo promover o fortalecimento das colônias. Mas, vale destacar que, para obter sucesso na introdução de colmeias para uma polinização agrícola adequada, é preciso planejamento com base nas características das variedades cultivadas e das abelhas.

Também é importante evidenciar que, em um contexto de parceria, com o aluguel de colmeias pelos produtores de abacate, é essencial a existência de comunicação contínua com os apicultores para uma convivência sinérgica e produtiva, permitindo a tomada de decisões em comum acordo, incluindo a transferência das colmeias para áreas seguras ou fechamento das colmeias antes, durante e algum tempo após a aplicação de defensivos agrícolas nos casos em que tal manejo for necessário.

Produção e Exportação

O Brasil está entre os 10 maiores produtores de abacate do mundo, tendo ocupado a sétima posição em 2020, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

A produção brasileira em 2020, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi de 266,8 mil toneladas, com um valor de produção de R$ 473,2 milhões. Os polinizadores contribuíram com R$ 307,6 milhões do valor total de produção de 2020 (cálculo realizado com base na metodologia de Giannini et al. 2015), que corresponde ao montante que os produtores deixariam de ganhar sem o serviço de polinização realizado pelas abelhas.

De acordo com o IBGE, os maiores produtores foram São Paulo, Minas Gerais e Paraná, que somaram 89% da produção brasileira em 2020. O Estado de São Paulo liderou com 49% da produção (130,2 mil toneladas), seguido por Minas Gerais, com 30% (80,8 mil toneladas), e Paraná, com 10% da produção (26,2 mil toneladas). Os municípios de Rio Paranaíba (15,9 mil toneladas), em Minas Gerais, Jardinópolis (8,6 mil toneladas) e Aguaí (8,3 mil toneladas), ambos em São Paulo, foram os maiores produtores de abacate.

O Brasil também é um exportador do fruto, principalmente da variedade Hass, conhecida como avocado. A participação no mercado externo ainda é pequena, mas está crescendo à medida que produtores têm investido na melhora da gestão de suas propriedades e na obtenção de certificações internacionais. Segundo a Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (ABRAFRUTAS), com dados compilados do sistema AGROSTAT/MAPA, em 2020, o Brasil exportou quase 7,6 mil toneladas de abacates (que correspondeu a 3% da produção total no mesmo ano). Em 2021 houve um aumento de 13% nas exportações (8,5 mil toneladas), com um faturamento de quase US$ 15 milhões.

abacate fruto aberto site

Práticas amigáveis aos polinizadores

Como o abacateiro é altamente dependente da visita de abelhas para gerar frutos, os produtores de abacate devem adotar práticas de manejo para promover a atração e a permanência dos polinizadores em suas propriedades, além do uso de colmeias da abelha-africanizada nos pomares. Vale ressaltar que ações de melhoria na qualidade dos habitats para os polinizadores também promovem a melhoria de outros serviços ambientais, como a regulação natural de populações de pragas, a proteção dos mananciais de água e a fertilidade do solo.

As abelhas não sobrevivem apenas com os recursos disponibilizados pelo cultivo, assim é fundamental que existam na propriedade fontes alternativas de pólen e néctar no período em que as plantações de abacate não estão florescendo. A conservação e a recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reserva Legal (RLs), conforme determina o Código Florestal Brasileiro, bem como o plantio de espécies de plantas nativas ao redor dos cultivos, fornecem alimento ao longo do ano e substratos para a construção de ninhos pelos polinizadores, principalmente os silvestres.

É importante identificar as espécies de plantas visitadas pelas abelhas nos diferentes meses do ano e incorporá-las na propriedade. No entanto, esse manejo da vegetação deve ser feito de forma a não competir com a floração do abacateiro para evitar o desvio de polinizadores dos pomares. Por exemplo, foi observado que a presença de culturas como a de laranja são mais atrativas e diminuem a presença das abelhas nas flores do abacateiro (Malerbo-Souza et al. 2000).

A pulverização de defensivos agrícolas deve ser evitada no período de floração, mas se o tratamento fitossanitário for indispensável para evitar danos econômicos na lavoura, cuidados especiais devem ser adotados para não atingir os polinizadores, como dar preferência a técnicas agronômicas de Manejo Integrado de Pragas (MIP).

A pulverização deve ser realizada com produtos de baixa toxicidade para as abelhas, ao final da tarde ou pela noite, quando elas não estão em atividade no campo. Foi observado que a abelha-africanizada visita as flores do abacateiro para a coleta de pólen e néctar das 8h às 18h, com maior frequência de visitação de 9h às 13h e entre 16h e 18h (Malerbo-Souza et al. 2000).

É essencial seguir todas as recomendações presentes nos rótulos e bulas, observando rigorosamente as boas práticas de tecnologia de aplicação dos produtos, incluindo medidas para evitar a deriva (porção do defensivo aplicado que não atinge o alvo desejado).

Em um contexto de parceria com o agricultor, vale ressaltar que o apicultor deve adotar as melhores práticas de manejo apícola, de acordo com a época do ano, visando à manutenção de colmeias populosas, saudáveis e adequadas para a polinização das plantações.

logo abelha 467 60abrafrutas 1

Texto produzido pela Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A.), em colaboração com a Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (ABRAFRUTAS).

 

Referências

Donadio LC (1995) Abacate para Exportação: Aspectos Técnicos da Produção. Publicações técnicas FRUPEX, 2, Embrapa.

Duarte OR (1998) A cultura do abacateiro.  Boa Vista, RR: Embrapa-CPAF.

FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations. FAOSTAT (2020) Disponível em http://www.fao.org/faostat/en/#data. Acesso em: 17 mar. 2021.

Giannini TC et al. (2015) The Dependence of Crops for Pollinators and the Economic Value of Pollination in Brazil. Journal of Economic Entomology 108, 849-857.

Giannini TC et al. (2020) Unveiling the contribution of bee pollinators to Brazilian crops with implications for bee management. Apidologie 51, 406-421.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Produção Agrícola Municipal (2019) Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/9117-producao-agricola-municipal-culturas-temporarias-e-permanentes.html?=&t=sobre. Acesso em: 17 mar. 2021.

Klein AM et al. (2020) A Polinização Agrícola por Insetos no Brasil. Um Guia para Fazendeiros, Agricultores, Extensionistas, Políticos e Conservacionistas. Albert-Ludwigs University Freiburg, Nature Conservation and Landscape Ecology.

Malerbo-Souza DT et al. (2000) Polinização em flores de abacateiro (Persea americana Mill.). Acta Scientiarum 22, 937-941.

Stout AB (1933). The Pollination of Avocados. University of Florida. Agricultural Experiment Station. Bulletin 257.