Pesquisadores brasileiros e alemães especialistas em abelhas e polinização se encontraram na quinta-feira, dia 24 de maio, no Rio de Janeiro (RJ), para trocar experiências e conhecimento sobre abelhas, polinizadores e polinização. Eles palestraram no Bee Workshop – German-Brazilian Bioeconomy Workshop, realizado no primeiro dia da conferência Green Rio 2018 (de 24 a 26 de maio).
“Uma cooperação Alemanha-Brasil seria muito bem-vinda. Poderia trazer bons resultados em várias atividades econômicas que estão vinculadas ao meio ambiente. As abelhas, em razão do importante serviço de polinização agrícola que prestam, são um dos temas que interessam muito para nós e sobre o qual temos muito o que conversar”, falou o organizador da parte alemã do workshop, Jens Pistorius, chefe do Instituto de Proteção das Abelhas do Julius Kühn-Institut, que é o Centro Federal de Pesquisas de Plantas Cultivadas do governo alemão.
Um dos organizadores do lado brasileiro do evento foi a A.B.E.L.H.A.. “Há muita ciência boa sendo feita nos dois países, gerando um conhecimento que precisa ser compartilhado. O workshop foi uma ótima oportunidade para ambos os lados conhecerem as suas respectivas realidades”, afirmou Ana Assad, diretora-executiva da Associação.
O pesquisador Klaus Wallner, da Universidade de Sttutgart-Hohenhein, apresentou um panorama da presença das abelhas na Alemanha, que é muito distinto do encontrado no Brasil. Lá existem cerca de 600 espécies, sendo que apenas a Apis mellifera é utilizada para a produção de mel. “A grande maioria das abelhas que habitam o nosso território é manejada por humanos, ao contrário do Brasil, em que a maioria é selvagem”, relata.
Wallner observou ainda que na Alemanha – maior consumidor de mel do mundo – 98% dos apicultores exercem a atividade por hobbie. Segundo ele, o país já está se recuperando nos episódios da Síndrome do Colapso da Colônia. Em 2016, a Alemanha tinha 20% mais colônias que em 2010 e 31% mais apicultores. “Muitos jovens urbanos passaram a criar abelhas depois de se conscientizarem da importância desses insetos”, comenta Wallner.
No entanto, ele observa que o país tem muitos desafios, como “a perda dramática de espécies de plantas com flores”. “Na Alemanha, as abelhas precisam viver num ambiente completamente influenciado por humanos. Temos ruas residenciais sem nenhuma flor e áreas imensas onde antes existiam uma rica flora e hoje são campos de grama”.
O biólogo Breno Freitas, da Universidade Federal do Ceará e consultor da A.B.E.L.H.A., fez o contraponto brasileiro à apresentação do especialista alemão, mostrando que o Brasil possui muito mais espécies de abelhas, entre 2 mil e 3 mil, sendo que mais de 1,8 mil documentadas.
Segundo Freitas, cresce no Brasil a noção da importância das abelhas para a polinização agrícola. “Mas ainda temos dificuldade de conscientizar os agricultores do efeito e dos ganhos do uso profissional de abelhas para polinização. Eles até usam, mas não sabem dimensionar a diferença, não sabem como as abelhas atuam.”
Cristiano Menezes, biólogo da Embrapa e também consultor científico da A.B.E.L.H.A., falou sobre as abelhas sem ferrão nativas do Brasil. “Hoje existe um grande mercado no Brasil em torno dessas abelhas. Há produtores criando esses insetos não para produzir mel, mas para comercializar as colônias. E tem gente pagando grandes somas por elas.”
Ele explicou que a grande variedade de espécies no Brasil é algo muito valioso para a polinização agrícola. “Temos abelhas de todos os tamanhos e com características distintas. Cada uma complementa a outra na visitação das flores e isso contribui muito para o retorno da polinização”, avalia. “Cada cultivo tem a sua abelha específica para fazer a polinização. Um exemplo é o açaí, em que somente insetos pequenos conseguem circular entre as flores.”
Jens Pastorius também palestrou, destacando como o instituto que ele coordena atua para proteger as abelhas. Falou também sobre a economia verde, que foi o tema do Green Rio. Observou que até a agricultura orgânica oferece riscos às abelhas, já que também usam defensivos, mesmo que orgânicos, para proteger as plantações. “Para as abelhas, não importam se são pesticidas convencionais ou orgânicos. As práticas agrícolas podem prejudicar as abelhas tanto na agricultura orgânica quanto na convencional.” De qualquer forma, ele frisou que “proteger as abelhas é essencial para a bioeconomia prosperar”.
Finalizando o workshop, Karina Cham, do Ibama, e a bióloga Roberta Nocelli, da Universidade Federal de São Carlos, apresentaram o que tem sido discutido no Brasil a respeito de conservação de abelhas e normatização das atividades apícolas e agrícolas de forma a garantir uma convivência harmônica entre os segmentos. Roberta insistiu em um ponto destacado na fala de Cristiano Menezes: “O Brasil precisa de muita, muita pesquisa sobre esses insetos. Ter essa grande diversidade de abelhas no Brasil é ao mesmo tempo o céu e o inferno, pois fica muito mais difícil estudar e entender a atuação delas no País.”
Entre as iniciativas que estão colaborando para o quadro brasileiro, Karina Cham destacou a chamada pública para pesquisas sobre polinizadores, realizada pelo Ibama em conjunto com órgãos do governo e a Associação A.B.E.L.H.A. “É a primeira parceria público-privada nessa área de pesquisa. O Brasil precisa de mais iniciativas como essas, que ajudam a resolver a grande lacuna de conhecimento que temos por aqui.”