Uma tecnologia inovadora utiliza parasitoides nativos para controlar as moscas-das-frutas (A.fraterculus e C. capitata). Pesquisadores do Laboratório de Entomologia da Embrapa Clima Temperado, em Pelotas (RS), empregaram a vespa Doryctobracon areolatus, que alcançou até 40%de parasitismo das larvas da mosca, considerada um dos grandes problemas da fruticultura no mundo.
Os cientistas informam que os resultados são promissores e indicam potencial de uso nos pomares como técnica de controle biológico dentro de uma estratégia de manejo integrado de pragas (MIP). O parasitoide poderá ser indicado tanto para cultivos orgânicos quanto para pomares convencionais.
Como é uma estratégia que não usa químicos, a ação da vespa é adequada à recente instrução normativa do Ministério da Agricultura (nº19 de 7/8/2019) que regulamenta os procedimentos para que as frutas brasileiras recebam a certificação internacional de produtos de origem vegetal.
“Vários países da União Europeia impõem restrições ao uso de defensivos químicos na fruticultura, por causa disso, para exportar para esses mercados o Brasil deve substituir as aplicações por alternativas limpas de controle de pragas”, esclarece o entomologista Dori Edson Nava, pesquisador da Embrapa.
Na prática, o uso desse parasitoide envolve etapas de produção das vespas, em laboratório, seguido de sua liberação nos pomares que estejam com ataque de moscas-das-frutas. Após a liberação, as fêmeas do parasitoide irão localizar as larvas da praga no interior dos frutos para proceder a oviposição (colocar seus novos no interior das larvas). Do ovo colocado pelo parasitoide, irá eclodir outra larva, que se alimentará das vísceras e do conteúdo do hospedeiro, até o momento em que ela se transformará em pupa, no interior do pupário da mosca-da-fruta. Após alguns dias, ocorrerá a emergência da vespa, evitando assim a perpetuação da mosca-da-fruta.
A pesquisa
Inicialmente, os cientistas coletaram informações básicas da biologia e ecologia da praga e, em especial, do parasitoide Doryctobracon areolatus. A segunda etapa procurou estabelecer uma técnica de criação tanto para o hospedeiro (a mosca-da-fruta), quanto para o parasitoide. “A ideia é aprimorar as técnicas de criação para serem mais baratas e darem menos mão de obra. Já que ela representa cerca de 50% do custo de produção nas criações”, observa Nava. As técnicas foram desenvolvidas e já estão disponíveis para produtores.
Também foram estudadas etapas relacionadas à seletividade de inseticidas ao parasitoide, comportamento de busca e parasitismo, entre outras. Todas essas fases são importantes para avaliar o possível uso da vespa em programas de controle biológico. “O que se busca é a resposta para a pergunta: qual é a taxa de parasitismo (controle) em condições de campo? O seu uso é viável?”, indaga Nava.
O cientista ressalta que o controle biológico não é uma opção única contra a mosca-das-frutas. Ele deve ser utilizado com outros métodos de controle dentro da filosofia do Manejo Integrado de Pragas (MIP).
Controle alternativo da mosca-das-frutas
Além disso, a disponibilização de agentes de controle biológico vem em boa hora, já que a maior parte das frutíferas não possui grade de produtos fitossanitários indicados.
No estudo, os resultados iniciais indicam taxas de parasitismo variáveis de 6,2% a 40%. Esses valores dependem de época de liberação da vespa, níveis de infestação da praga, espécies de mosca-das-frutas entre outros fatores. O trabalho terá outras etapas de avaliação e estudos que estão programadas para os próximos anos.
A equipe de pesquisa ainda não tem uma estimativa de custos de produção com o uso de parasitoides. Nava revela que a tendência é haver um custo inicial mais elevado que diminuirá ao longo do tempo à medida em que a tecnologia se popularizar e for empregada em uma escala maior. “Existe uma percepção do produtor e da comunidade em geral de que o uso do controle biológico reduz custos de produção. Na verdade, o custo do controle depende de mercado. Quanto maior o mercado, menor será o custo”, analisa Nava.
O futuro do estudo
O cientista informa que ainda faltam outras etapas para estabelecer parâmetros de liberação do parasitoide (época, quantidade, frequência,etc). A tecnologia de controle biológico é desenvolvida em parceria com uma empresa local, a Partamon. A ideia é que ela comercialize a tecnologia no futuro.
Além da Partamon, o parasitoide Doryctobracon areolatus (à direita) poderá ser produzido em biofábricas, como a Moscasul, que está sendo instalada em Vacaria (RS) e que empregará a Técnica do Inseto Estéril e de parasitoides para o controle biológico de mosca-das-frutas. “Além da geração de tecnologia é necessário avançar nos programas de manejo de mosca-das-frutas e que envolve não apenas o fruticultor, mas também as instituições públicas e as privadas”, completa o pesquisador. Isto ocorre devido a necessidade de se realizar um controle mais abrangente geograficamente para o grupo das moscas-das-frutas, já que o controle local resolve o problema apenas momentaneamente.
As dificuldades do controle químico
Atualmente, para mosca-das-frutas existem produtos químicos registrados e permitidos no Brasil apenas para pomares de citros, maçã e pêssego. Para a maioria das culturas não existem, ou há uma deficiência, de defensivos químicos registrados.
“A maioria das frutíferas não tem mais produtos registrados para controle de mosca-das-frutas. Além disso, os que sobraram, principalmente os do grupo dos organofosforados, já foram banidos pelos países da União Europeia”, informa o pesquisador da Embrapa. Segundo ele, uma boa parte dos países já utiliza o controle biológico como estratégia de controle da praga. Ele destaca a atuação do México, Israel e Chile, como referência em controle biológico de mosca-das-frutas, o que possibilita a exportação de suas frutas para vários mercados consumidores mundiais.
Os pomares com infestação de mosca-das-frutas não são aptos para exportação e as perdas causadas também provocam prejuízos no mercado interno brasileiro. Nava explica que as larvas da mosca-das-frutas destroem a polpa dos frutos para se alimentar. “Ao realizar a postura, as fêmeas introduzem o ovipositor, causando um ferimento [abertura], que facilita a entrada de fungos causadores de podridões. Além disso, os danos provocam o amadurecimento precoce e consequente queda dos frutos”, detalha Nava.
Estudos indicam que dos 14,7 bilhões de dólares anuais de perdas econômicas na agricultura causadas por insetos, 1,6 bilhão está associados à produção de frutas. De acordo com avaliação realizada pelo Mapa, em 2015, para o Brasil, ao levar em consideração as perdas de produção, comercialização e custos de controle, somente as moscas-das-frutas causam um prejuízo anual de 180 milhões de reais.
As moscas-das-frutas pertencem à família Tephritidae. Existem várias espécies descritas, mas apenas algumas causam danos econômicos. Entre essas se destacam a mosca-das-frutas sul-americana Anastrepha fraterculus e a mosca-do-mediterrâneo Ceratitis capitata.
Fonte: Embrapa Clima Temperado – Cristiane Betemps