O algodão está entre as mais importantes culturas de fibras no mundo: anualmente, são plantados em média 35 milhões de hectares. O comércio mundial movimenta anualmente cerca de US$ 12 bilhões e envolve mais de 350 milhões de pessoas em sua produção, desde as fazendas até a logística, o descaroçamento, o processamento e a embalagem.
No Brasil, o volume médio é próximo de 1,7 milhão de toneladas de pluma, o que coloca o País entre os cinco maiores produtores mundiais, ao lado de China, Índia, EUA e Paquistão.
Os dados são da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), entidade criada em 1999 e constituída por nove associações estaduais, que reúnem mais de mil produtores brasileiros. Associada à A.B.E.L.H.A., a Abrapa busca conscientizar os produtores sobre a necessidade de praticar o manejo integrado de pragas preservando os inimigos naturais e os polinizadores.
Além disso, as recomendações da associação aos produtores são no sentido de ampliar a produtividade por meio da presença de polinizadores. Embora possa se autofecundar, diversos estudos revelam que a presença de abelhas é altamente positiva para a produção de algodão, pois tem efeitos sobre o aumento do número de sementes, a produtividade e o peso dos capulhos.
Em entrevista à A.B.E.L.H.A., o diretor-executivo Márcio Portocarrero fala do trabalho da Abrapa, avalia os principais desafios do setor e aborda a importância da adoção de boas práticas e da convivência saudável entre agricultores e produtores de mel. “Entendemos que uma parceria positiva entre agricultores e produtores de mel e seus derivados é possível e altamente viável do ponto de vista ambiental e econômico”.
A.B.E.L.H.A. – O Brasil é o 5° maior produtor de algodão. Como você avalia o desempenho das regiões Centro-Oeste e Nordeste e o mercado?
Márcio Portocarrero – O Brasil cultiva hoje 959.306 hectares de algodão, sendo que mais da metade no Mato Grosso e 30% na Bahia. A safra está em fase de colheita e as perspectivas são de que será uma safra muito boa. Com relação a preços, os produtores estão conseguindo margem de lucro líquido muito baixa devido ao alto custo dos insumos agrícolas (sementes, adubo e defensivos) e à precária infraestrutura de escoamento brasileira.
A.B.E.L.H.A. – Quais são os principais desafios para o produtor brasileiro?
Márcio Portocarrero – Atualmente, o principal desafio é fazer ampliar a oferta de inseticidas, herbicidas e fungicidas visando ao controle de pragas e doenças. Devido à extrema burocracia dos órgãos registrantes (Anvisa, Ibama e Mapa), estamos com uma grande defasagem em relação à oferta de novos produtos no mercado brasileiro, comparando-se com o resto do mundo. Aqui no Brasil, o prazo para obtenção de um registro de novo produto é de aproximadamente 10 anos – geralmente, quando se obtém o registro, o produto já está ultrapassado em relação ao resto do mundo. Isso sem falar que o Brasil é o País que pratica os maiores preços de defensivos agrícolas, o que reduz em muito a competitividade do produtor de algodão brasileiro.
A.B.E.L.H.A. – Qual o principal trabalho da Abrapa em relação ao aumento da produtividade, especialmente no Nordeste? Como os pequenos produtores, que não tenham acesso à tecnologia de ponta, podem incrementar seus negócios e sua renda?
Márcio Portocarrero – A Abrapa atua em sintonia com as nove associações Estaduais de produtores de algodão e essas agem em sintonia direta com os produtores a elas filiados. Hoje possuímos em torno de 1000 produtores de algodão filiados a tais associações, e o grande anseio desses produtores é a busca de um modelo tecnológico que lhes permita lançar mão da mais alta tecnologia disponível, incluindo o manejo da fertilidade dos solos, o uso de variedades corretas, o manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas, as boas práticas culturais, a colheita adequada e o beneficiamento correto. O objetivo é obter maior rendimento das lavouras, com pluma e caroço de qualidade para um mercado bastante exigente.
Em virtude da alta tecnologia e da necessidade de mecanização total em todas as fases das lavouras de algodão, os pequenos produtores somente se viabilizam quando organizados em associações e cooperativas que lhes permitam o uso coletivo de colheitadeiras e máquinas de beneficiamento de algodão, bem como lhes possibilita a presença constante de engenheiros agrônomos nas suas lavouras, sendo estes vinculados a cooperativas ou associações. Cultivar algodão em pequenas áreas e sem contar com o apoio de uma associação ou cooperativa é inviável economicamente.
A.B.E.L.H.A. – As abelhas são importantes para a polinização do algodão. Como a Abrapa atua para incentivar os produtores a preservar e incrementar a presença desses insetos em suas áreas?
Márcio Portocarrero – Com relação aos insetos polinizadores, a Abrapa, juntamente com as suas nove associações estaduais, busca conscientizar os produtores sobre a necessidade de praticar o manejo integrado de pragas preservando os inimigos naturais dessas pragas e os polinizadores. Todas as práticas visando à preservação das colônias de abelhas são adotadas pelos produtores de algodão, o que possibilita incrementar a produtividade e a rentabilidade nas lavouras.
A.B.E.L.H.A. – Em estudo realizado pelo Cenargen, identificou-se que a produtividade na cultura do algodão aumentou 27% com a presença de quatro espécies de abelhas em propriedades do Nordeste brasileiro. Há potencial para que a produtividade brasileira aumente com esse incentivo?
Márcio Portocarrero – Reconhecemos a importância dos insetos polinizadores e incentivamos os produtores a adotarem todas as práticas que ajudem a conservar tais espécies nas suas propriedades. Esperamos que, com a agilização do processo de registro de novos inseticidas no Brasil, possamos possibilitar que os agricultores realizem o controle químico ou biológico com maior segurança e eficiência, incluindo-se aí a preservação das espécies benéficas.
A.B.E.L.H.A. – De que forma a relação entre apicultores e agricultores pode ser estimulada para que ambos possam colher benefícios da polinização do algodão? Qual o papel que a Abrapa e a A.B.E.L.H.A. podem desempenhar nesse sentido?
Márcio Portocarrero – Muitos produtores de algodão/soja/milho possuem colmeias nas suas propriedades e entendemos que esta é a melhor forma de monitorar a presença de tais insetos no meio ambiente. Entendemos que uma parceria positiva entre agricultores e produtores de mel e seus derivados é possível e altamente viável do ponto de vista ambiental e econômico. Precisamos definir critérios de convivência das colmeias com as lavouras, fixando regras e procedimentos que possibilitem a utilização de produtos químicos e/ou biológicos em horários adequados e da forma recomendada. Entendemos que, dado ao alto grau de tecnologia empregado nas lavouras de algodão, esta não seria uma dificuldade muito grande.
Ficha técnica
Entrevistado: Márcio Portocarrero
Instituição: Associação Brasileira dos Produtores de Algodão – Abrapa
Tema: Polinizadores na cultura do algodão