O professor emérito e professor sênior da Universidade de São Paulo Paulo Nogueira Neto fala da importância da conservação do meio ambiente e do estudo de práticas que permitam a convivência harmônica entre abelhas e a atividade agrícola.
Aos 93 anos, Paulo Nogueira Neto é uma das grandes referências quando se fala em conservação ambiental – e não apenas no Brasil. É considerado por muitos o “pai dos ambientalistas” no País. Ele é modesto ao falar sobre isso, mas tem orgulho de ter sido um dos pioneiros na defesa do meio ambiente. “A melhor coisa que fiz na vida foi conseguir que a proteção ao meio ambiente passasse a ser defendida: faz parte do amor ao próximo”.
Católico praticante, formado em Direito e em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo, Dr. Paulo foi pioneiro no estudo das abelhas sem ferrão no Brasil, e é autor de Vida e Criação de Abelhas Indígenas Sem Ferrão, livro de cabeceira para a maior parte de estudantes e profissionais da área. Foi o primeiro secretário especial de Meio Ambiente do Governo Federal, equivalente hoje ao cargo de Ministro.
Nesta entrevista para a A.B.E.L.H.A., por ocasião do Dia Internacional da Biodiversidade e Dia do Apicultor no Brasil (22 de maio), o professor emérito e professor sênior da Universidade de São Paulo fala da importância da conservação do meio ambiente e do estudo de práticas que permitam a convivência harmônica entre abelhas e a atividade agrícola.
A.B.E.L.H.A. – Como o senhor avalia a conservação das abelhas no mundo neste momento? Podemos dizer que elas estejam ameaçadas?
Paulo Nogueira Neto – Não acredito que haja um problema mundial. Há em alguns países certas dificuldades, como surtos de enfermidades, por exemplo. Mas é preciso examinar caso a caso e adotar medidas de prevenção e solução. As introduções devem ser feitas com cuidado. Veja o caso das abelhas africanas. Quando meu colega e grande pesquisador Warwick Kerr iniciou seu trabalho no Brasil com elas, não era possível imaginar que elas gerariam um problema sério, como foi passado. De toda forma, superadas as dificuldades, o Brasil pôde dar um impulso na criação de abelhas e na produção de mel. Ficou para todos nós uma lição importante.
A.B.E.L.H.A. – No Brasil, quanto se caminhou no sentido de viabilizar a agricultura em larga escala e a conservação das abelhas?
Paulo Nogueira Neto – Ainda há muito a se fazer, certamente. Acredito que não haja ainda hoje um estudo amplo sobre isso, pois não é fácil, leva tempo. Mas é preciso considerar a presença de abelhas e a atividade agrícola, as necessidades de parte a parte, as legislações que se aplicam a ambos os lados. Acima de tudo, estão os interesses coletivos, e a alimentação é o principal deles.
A.B.E.L.H.A. – Qual a importância de ampliar o conhecimento da sociedade sobre a vida desses insetos e sua preservação?
Paulo Nogueira Neto – O conhecimento é fundamental. A criação de associações é um dos caminhos, e é muito importante para difundir o conhecimento, compartilhar informações que devam ser conhecidas. Fico entusiasmado com a iniciativa da A.B.E.L.H.A., ela representa um progresso. É fundamental ampliar o conhecimento sobre o papel das abelhas na polinização, na produção agrícola e sobre a conservação do meio ambiente.
Buscar o conhecimento sobre as abelhas foi o que me motivou e direcionou minha vida profissional. Certa vez, fui visitar meu cunhado na fazenda de meu sogro. Meu cunhado se esqueceu do nosso encontro e, como anfitrião, meu sogro me levou a conhecer sua criação de abelhas. Saí de lá com um presente, uma colônia de jataís. Não as conhecia, comecei a pesquisar e vi que não havia quase nenhum conhecimento sobre elas. Tomei como desafio e me aprofundei a partir de então.
A.B.E.L.H.A. – O senhor é conhecido como o “pai dos ambientalistas” e sempre trabalhou fortemente o conceito de desenvolvimento sustentável, quando ainda nem se falava nisso. O que é ser um ambientalista nos dias atuais?
Paulo Nogueira Neto – Não me considero o pai dos ambientalistas. O que eu fiz foi criar uma unidade pública que tratava dessas questões quando isso não era ainda uma preocupação de muitos (referindo-se à SEMA, Secretaria Especial de Meio Ambiente, órgão do governo federal ligado ao Ministério do Interior que, nas décadas de 70 e 80, era responsável pelo setor ambiental no Brasil). A melhor coisa que fiz na vida foi conseguir que a proteção ao meio ambiente passasse a ser defendida: faz parte do amor ao próximo. E isso envolve pessoas de todas as classes, vertentes ou partidos políticos.
Fui nomeado, como Secretário do Meio Ambiente, a integrar o grupo de 23 pessoas, de diversos países, que formou o comitê da ONU (Comissão Brundtland de Meio Ambiente e Desenvolvimento) para tratar o que hoje é chamado de desenvolvimento sustentável. Foi uma honra e um grande prazer. Temos que procurar o que é sustentável, em todos os campos da vida, e o mundo não é sustentável se não cuidarmos do meio ambiente. A vida humana depende disso.
A.B.E.L.H.A. – A apicultura é uma atividade de suma importância para o país. Como o senhor acredita que a atividade deva ser promovida?
Paulo Nogueira Neto – Assim como a saúde depende dos médicos e a educação, dos professores, a sustentação ambiental depende de profissionais ligados à preservação ambiental. O apicultor é personagem fundamental desse processo, e a atividade deve ser promovida por meio de iniciativas não-governamentais e políticas públicas. Os Estados têm entidades, universidades e iniciativas que se dedicam a pesquisar e aplicar o conhecimento sobre o assunto. Outro caminho são as reuniões científicas, para disseminar o conhecimento gerado na Academia.
Ficha técnica
Entrevistado: Paulo Nogueira Neto
Instituição: USP
Tema: Conservação da biodiversidade e Apicultura