Mel da florada do açaí possui altos teores de compostos antioxidantes

Crédito da imagem em destaque: Ronaldo Rosa

O mel de abelhas africanizadas (Apis mellifera L.), produzido a partir da florada do açaizeiro, possui elevados níveis de compostos bioativos derivados da palmeira amazônica. Essas substâncias são reconhecidas por ter um papel importante na promoção e manutenção da saúde humana. A descoberta é resultado da análise e comparação de méis com origens em diferentes regiões do País e abre caminho para a valorização de um produto da sociobiodiversidade amazônica.

O artigo, intitulado Evaluation of the Bioactive Compounds of Apis mellifera Honey Obtained from the Açai (Euterpe oleracea) Floral Nectar, foi publicado na revista científica Molecules por pesquisadores Embrapa, Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Para ser considerado um mel monofloral, o produto do trabalho das abelhas deve ter na sua origem a predominância de néctar da flor de uma determinada espécie vegetal. A legislação brasileira estabelece como critério para essa classificação a presença de pólen de uma única espécie superior a 45% em uma amostra de mel.

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Crédito: Vinicius Braga

Essa concentração em um tipo de florada confere ao mel características únicas no sabor, aroma e cor, além de propriedades funcionais específicas. No caso do mel de açaí, as amostras coletadas no município de Breu Branco (PA) e Santa Maria (PA) foram analisadas e comparadas com méis monoflorais de quatro origens: mel de aroeira, de Minas Gerais; mel de cipó-uva, do Distrito Federal; mel de Timbó, do Rio Grande do Sul; e mel do mangue, do Pará.

De acordo com o pesquisador Daniel Santiago, da Embrapa Amazônia Oriental (PA) e um dos autores, a escolha desses méis para comparação se deveu às reconhecidas propriedades funcionais e à presença de compostos bioativos que eles possuem, em especial o mel de aroeira, um dos mais valorizados do País.

Benefícios à saúde

As análises revelaram que o mel de açaí possui elevada capacidade antioxidante. Entre as amostras, o mel monofloral da palmeira amazônica superou em quatro vezes o mel de aroeira na avaliação dessa atividade. “Isso sugere que os méis compostos predominantemente da florada do açaizeiro têm uma capacidade antioxidante mais forte, provavelmente devido a maiores concentrações de polifenóis e outros compostos bioativos”, afirmam os autores.

Outro autor do artigo, o professor da UFPA Nilton Muto, explica que os compostos bioativos, como os polifenóis presentes no mel de açaí, são substâncias encontradas em alimentos e, embora não sejam consideradas nutrientes essenciais (como vitaminas ou minerais), podem ter efeitos benéficos para a saúde. Eles ocorrem naturalmente em pequenas quantidades em plantas e animais e podem influenciar funções biológicas e processos metabólicos no organismo.

“Os polifenóis são uma classe de compostos bioativos e atuam como antioxidantes, neutralizando os radicais livres, e podem ter propriedades anti-inflamatórias, anticancerígenas e cardioprotetoras”, afirma Muto.

De acordo com a literatura científica, a maior concentração de compostos bioativos está relacionada à coloração do mel para um tom mais escuro. E isso se verificou na coloração das amostras de méis de açaí, que variaram de âmbar a âmbar escuro. Muto esclarece, no entanto, que outros fatores também podem influenciar a coloração escura do mel, como os processos de desumidificação e a maturação do produto. “No caso do mel de açaí, ele fica escuro, quase totalmente negro, o que acaba se tornando um atrativo para o produto”, avalia.

Quanto ao sabor do mel de açaí, o professor afirma que o produto foi muito bem avaliado pelos grupos de voluntários e analistas sensoriais. Ele não chega a ser tão doce quanto os demais e possui notas de café. “É um mel diferenciado. Acredito que será muito bem aceito pelo público em geral e facilmente incorporável na gastronomia”, observa o professor.

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Crédito: Vinicius Braga

As análises da pesquisa também confirmaram a presença de vários compostos bioativos que a literatura científica relaciona a propriedades anti-inflamatórias, antibacterianas, antimicrobianas e antitumorais no mel de açaí. Segundo Muto, a verificação dessas capacidades já é objeto de outras pesquisas em andamento.

Atividade com potencial de expansão

Impulsionados pelo crescente preço do fruto, os plantios de açaizeiro têm se expandido no Pará e os produtores têm buscado formas de incrementar a produtividade por meio da polinização dirigida. Nesse processo, as abelhas são introduzidas nos locais de plantio para que visitem as flores e realizem a polinização.

No Pará, as abelhas que melhor desempenham o papel de polinizar o açaizeiro são as espécies nativas, conhecidas como abelhas sem ferrão. No entanto, o pesquisador da Embrapa explica que, como não existe um mercado estabelecido para oferecer colmeias de abelhas sem ferrão, a alta procura inviabilizou o acesso a muitos agricultores interessados na polinização dirigida do açaizeiro. “Há lugares onde uma colmeia de abelha sem ferrão chega a custar 600 reais”, exemplifica.

Dessa forma, uma alternativa utilizada pelos produtores de açaí para a polinização dirigida tem sido a criação de abelhas da espécie Apis mellifera, conhecidas popularmente como africanizadas, por se tratar de um híbrido oriundo do cruzamento de raças europeias e africanas.

Elas são maiores que as nativas, o que representa uma desvantagem no contato com as flores pequenas do açaí, e visitam bem mais as flores masculinas que as femininas. “Ainda assim, as abelhas africanizadas possuem um raio de ação maior, que pode chegar a 1.500 metros, o que favorece que sejam colocadas nas bordas dos cultivos”, pontua.

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Crédito: Ronaldo Rosa

De acordo com Santiago, ainda não há dados científicos sobre a efetividade da polinização dirigida com abelhas africanizadas para o cultivo do açaí, apenas a percepção positiva dos produtores. “Os resultados da caracterização do mel do açaí impõem que devem ser aprofundados estudos para averiguar o impacto da ação das abelhas Apismellifera nessa cultura. Ao identificar cientificamente esse impacto, a atividade ganhará mais conhecimento específico para o manejo dessas abelhas no trópico úmido”, afirma.

Em 2023, o Brasil produziu 64 mil toneladas de mel. À região amazônica, coube aproximadamente 2% desse total, dos quais o Pará figura com 1,5%. De acordo com o pesquisador, a atividade da apicultura tem grande potencial de ampliação no estado e hoje envolve cerca de 3 mil famílias. “Considerando que o açaí se transformou em um produto internacionalmente conhecido, é possível que osderivados relacionados à identidade dessa fruta também contribuam para aprimorar a apicultura da região”, conclui.

 

Fonte: Embrapa – Vinicius Soares Braga