As abelhas são fundamentais para a polinização das plantas e para o equilíbrio ambiental. A fama da ferroada dolorida, no entanto, costuma ser a coisa mais lembrada no que diz respeito a esse bichinho. Imagine então uma abelha que não tem ferrão, nativa das matas brasileiras, que cumpre o papel da polinização e ainda por cima produz um mel quatro vezes mais caro que o convencional? Esse “sonho”, para os que têm medo de abelhas, existe e produtores paranaenses perceberam todas essas qualidades. Agora, o que era praticamente um hobby no Paraná até um tempo atrás, se transformou em um negócio, com potencial para crescer a passos largos nos próximos anos.
O primeiro aspecto que chama a atenção na produção de mel de abelhas sem ferrão é o preço. Enquanto o produto convencional “fabricado” pela abelha com ferrão custa R$ 30 o quilo, o mel das abelhas nativas custa R$ 120 o quilo. Um dos motivos é que as abelhas sem ferrão, por serem menores em tamanho e/ou número de indivíduos por colmeia, produzem menos mel. Enquanto uma “família” com ferrão produz em média entre 25 kg a 30 kg por ano, as sem ferrão (dependendo da espécie) chegam no máximo a 1,5 kg por ano.
Mas há outros elementos envolvidos e, por ser um mercado recente, não se sabe ao certo quanto pode valer esse “novo” mel na mão de chefs renomados e/ou no mercado internacional, por exemplo. É um produto fino, a ser apreciado em pequenas quantidades e uma textura mais líquida. Todos têm uma doçura singular, mas cada abelha tem suas peculiaridades, como acidez mais ou menos acentuada e toques florais diferentes a depender da época do ano e da espécie.
O meliponicultor Benedito Antônio Uczai, de Mandirituba, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), tem em menos de um alqueire centenas de caixas de abelhas sem ferrão de 10 espécies diferentes. Ele ainda divide sua rotina entre o cuidado com os animais e a produção de frutas, mas pretende, em breve, fazer da criação de abelhas nativas o seu negócio principal. “Antes, a venda da minha produção de mel de abelhas nativas era para conhecidos, no boca a boca, não tinha como colocar o produto em nenhum ponto. Agora, conseguimos a rotulagem e vamos poder entrar nos mercados, o que dá outra visibilidade ao nosso negócio”, diz.
O processo para conseguir esse rótulo levou anos de empenho dele e de outros produtores que se reuniram e formaram a Associação dos Meliponicultores de Mandirituba (Amamel). Foram inúmeras idas e vindas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para chegar a esse resultado. O que eles ainda não têm é a estrutura para o envase conforme as exigências do Serviço de Inspeção Federal (SIF). Por isso, os produtores têm uma parceria com a empresa de mel convencional Napisul, de Agudos do Sul, na região metropolitana de Curitiba. Essa indústria é quem envaza para eles o mel de abelhas nativas.
O presidente da Amamel, Marcos Antônio Dalla Costa, conta que desde 2010 ocorre um trabalho de organização dos meliponicultores na região de Curitiba. Atualmente, no estado, a associação é referência para quem busca informações sobre a meliponicultura. No total, são cerca de 20 associados ativos, ou seja, que têm entre suas atividades agrícolas a venda de mel de abelhas nativas sem ferrão. “Nossa intenção é mostrar que essa é uma atividade econômica lucrativa que consegue aliar preservação ambiental com a geração de renda em uma prática com pilares na sustentabilidade”, enfatiza.
Técnicas de manejo ainda passam por ajustes
O meliponicultor Benedito Antônio Uczai relata que quando começou a criar abelhas nativas, ele e outros produtores tiveram que aprender na prática as melhores técnicas de manejo. Eles descobriram “na unha” as melhores medidas e materiais para as caixas, como precisam estar dispostas as colmeias umas em relação às outras e que espécies se dão bem umas com as outras. “Na meliponicultura tudo é muito novo e até hoje descobrimos coisas novas sobre o trabalho todos os dias”, relata.
Até o levantamento de custos ainda precisa de ajustes. Hoje é difícil dizer o quanto foi necessário investir e o quanto se gasta para manter as colmeias, segundo Uczai. Em cálculos de custeio estimados por ele, considerando o tempo e insumos gastos, ele chegou ao preço que pratica em seus produtos: R$ 17 a garrafinha com 70 gramas e R$ 60,00 a garrafinha com 345 gramas.
Recentemente, a Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar), vinculada à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento, lançou uma portaria (63/2017) para começar a estabelecer um regulamento técnico para questões referentes à identidade e qualidade do mel das abelhas sem ferrão no Paraná. É um primeiro passo, que deve ter ainda muitos outros até que sejam definidos padrões e procedimentos técnicos para a criação das abelhas nativas.
A meliponicultura no PR
No Paraná se estima que haja 35 espécies de abelhas sem ferrão. Pelo menos 15 delas têm potencial para a produção de mel em escala comercial. Em todo o estado existem mais de 5 mil produtores, nas diversas regiões. Os dados são da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab).
A conta não considera ainda todos os “meliponicultores” amadores, que têm os animais quase como animais de estimação. A maioria das abelhas sem ferrão é dócil e não exige grandes cuidados. Isso torna possível ter uma colmeia em uma sacada de um apartamento, por exemplo – desde que haja alimento disponível no raio de alcance das abelhas.
Fonte: Gazeta do Povo – Antonio C. Senkovski