Caju

caju

O cajueiro (Anacardium occidentale) é uma árvore que pertence à família Anacardiaceae e é nativa do Brasil. É cultivado principalmente na região Nordeste, com destaque para os Estados do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, em plantações abertas (Klein et al. 2020).

Polinização por animais

O cajueiro apresenta flores com autoincompatibilidade parcial, ou seja, o grão de pólen produzido por uma flor até pode fecundá-la ou fecundar as outras flores da mesma planta, porém a produção de frutos será muito baixa. Para o vingamento de mais frutos é necessário que o pólen seja trocado entre indivíduos diferentes, assim, o cajueiro é um cultivo altamente dependente de polinização cruzada para a fecundação das flores (Holanda-Neto et al. 2002; Freitas et al. 2014a).

Por ser altamente dependente de polinização cruzada, se todo um pomar de cajueiros fosse isolado e suas flores não recebessem visitas de seus polinizadores haveria uma redução de 40% a 90% na produção de frutos (Giannini et al. 2015; Klein et al. 2020). No cajueiro, a transferência de pólen (que contém o gameta masculino) de uma flor até a parte feminina de outra, o que garante a fecundação e a formação do fruto, é realizada principalmente pelas abelhas – o pólen é muito pesado para ser transferido pelo vento (Freitas et al. 2014a).

O verdadeiro fruto do caju é a castanha, principal produto explorado e consumido no Brasil e no mundo. A polpa resulta do desenvolvimento de uma parte da flor denominada pedúnculo, assim o caju é formado pelo conjunto castanha-pedúnculo. O uso industrial do pedúnculo ainda é baixo e concentra-se na produção de suco.

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Visita das abelhas

As flores do cajueiro são atrativas para várias espécies de insetos, principalmente abelhas. No entanto, apenas algumas delas realizam a polinização, entre elas a abelha-africanizada (Apis mellifera), que visita as flores para coletar o néctar.  Outro grupo de abelhas que poliniza as flores do cajueiro são espécies do gênero Centris, especialmente a Centris tarsata, conhecida popularmente como abelha-de-óleo. Essa abelha de modo de vida solitário visita as flores do cajueiro para coletar pólen e néctar (Freitas e Paxton 1998; Giannini et al. 2020).

Abelha-de-óleo (Centris flavifrons) visitando a flor do cajueiro.
Abelha-de-óleo (Centris flavifrons) visitando a flor do cajueiro. Crédito: Epifânia Emanuela Rocha
Abelha africanizada em flor de cajueiro
Abelha africanizada em flor de cajueiro. Crédito: Breno Magalhães Freitas

Também é comum a presença de formigas do gênero Camponotus nas flores do cajueiro, mas normalmente se restringem a coletar néctar de nectários extraflorais e não tocam nos órgãos reprodutivos das flores – assim, não realizam a polinização (Freitas e Paxton 1996).

O período de floração do cajueiro ocorre de junho a outubro e a colheita, de agosto a dezembro. As variedades cultivadas no Brasil incluem: anãs (BRS 189, BRS 226, BRS 253, BRS 265, CCP 06, CCP 09, CCP 1001, CCP 76, Embrapa 50, Embrapa 51) e a gigante (BRS 274) (Klein et al. 2020).

Ganhos para os dois lados

Estudos conduzidos no Nordeste do Brasil encontraram déficits de polinização em cultivos de cajueiro – diferença entre o que é produzido e o potencial máximo de produção da planta (Holanda-Neto et al. 2002; Freitas et al. 2014b). Neste cenário, o manejo de colônias da abelha-africanizada nas plantações durante a floração aumenta as visitas às flores e, consequentemente, a produção de castanhas, elevando o lucro dos cajucultores.

Em contrapartida, o cajueiro fornece recursos alimentares para as abelhas, permitindo que o apicultor aumente sua renda por meio da colheita do mel. Além de ser uma fonte de néctar, o cajueiro floresce no período seco do ano, quando há menor disponibilidade de flores no ambiente, por isso é um cultivo bastante atrativo para os apicultores – que costumam instalar as colmeias nas plantações de julho a agosto (Freitas 1994).

Em um contexto de parceria, vale destacar a necessidade de comunicação contínua entre cajucultores e apicultores para uma convivência sinérgica e produtiva, assim ambos podem explorar suas atividades econômicas na mesma área, sem interferência negativa. É importante que os apicultores instalem suas colmeias nos locais seguros de comum acordo com os proprietários das áreas, e os cajucultores notifiquem com antecedência os apicultores que possuem colmeias em suas propriedades e propriedades vizinhas quando da necessidade de aplicação de defensivos agrícolas.

Produção, exportação e importação

O Brasil está entre os 10 maiores produtores de castanha de caju do mundo. A produção brasileira em 2019, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi de 138,7 mil toneladas, com um valor de produção de mais de R$386,2 milhões. Os polinizadores contribuíram com mais de R$251 milhões do valor total de produção de 2019 (cálculo realizado com base na metodologia de Giannini et al. 2015), que corresponde ao montante que os produtores deixariam de ganhar sem o serviço de polinização realizado pelas abelhas.

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De acordo com o IBGE, os maiores produtores foram os Estados do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, que somaram 91% da produção brasileira em 2019. O Ceará liderou com 63% da produção (87,6 mil toneladas), seguido pelo Piauí com 16% (21,6 mil toneladas) e pelo Rio Grande do Norte com 12% da produção (16,8 mil toneladas). Os municípios de Bela Cruz (16 mil toneladas) e Beberibe (11,8 mil toneladas), no Ceará, e Pio IX no Piauí (8 mil toneladas) foram os maiores produtores de castanha de caju.

O Brasil também é um exportador de castanha de caju. Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Comex Stat – MDIC), em 2019, o Brasil exportou 17 mil toneladas de castanha de caju (que correspondeu a 12% da produção total no mesmo ano) para 66 países, entre eles, Estados Unidos (35% do total exportado), Canadá (13%) e Holanda (11%). As exportações de castanha totalizaram mais de US$121,2 milhões. O Estado que mais exportou o fruto foi o Ceará (13,9 mil toneladas, somando US$99,5 milhões).

Práticas amigáveis aos polinizadores

Além do uso de colmeias da abelha-africanizada para a polinização das flores de cajueiro, é essencial que os cajucultores adotem  práticas de manejo para promover a atração e a permanência de diferentes espécies de abelhas em suas propriedades, pois a presença de uma maior diversidade de polinizadores aumenta significativamente a produção de frutos.

Com o objetivo de disponibilizar de forma acessível informações sobre a importância da polinização no incremento da produtividade do cajueiro no Brasil e sugerir estratégias de manejo que favoreçam uma polinização adequada, foi publicado, pelo professor Breno Magalhães Freitas e colaboradores, o Plano de Manejo para Polinização da Cultura do Cajueiro: Conservação e Manejo de Polinizadores para Agricultura Sustentável, através de uma Abordagem Ecossistêmica, do qual destacamos algumas práticas (para conhecer todas as práticas, consulte o material):

  • Os polinizadores não sobrevivem apenas com os recursos disponibilizados pelos cultivos, assim é fundamental que existam na propriedade fontes alternativas de pólen e néctar no período em que os cajueiros não estão florescendo. A conservação e a recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reserva Legal (RLs), bem como o plantio de espécies de plantas cultivadas e nativas ao redor dos cultivos, fornecem alimento ao longo do ano e substratos para a construção de ninhos pelos polinizadores.
  • A abelha-de-óleo Centris tarsata, importante polinizador do cajueiro, recebe esse nome popular pois as fêmeas usam o óleo floral disponibilizado por algumas espécies de plantas, como as da família Malpighiaceae, como matéria-prima na construção das células de cria e misturado ao pólen para alimentar as larvas (Alves-dos-Santos et al. 2007). Assim, para garantir a presença dessa abelha na propriedade, é importante a existência de plantas que fornecem óleo floral, como as diversas espécies do gênero Byrsonima, principalmente B. crassifolia – conhecidas popularmente como murici –, ou a aceroleira (Malpighia emarginata).
  • Uma maneira de manejar a C. tarsata próxima aos cajueiros é por meio da instalação de ninhos-armadilha para a atração de fêmeas, dado que essa abelha constrói seus ninhos em cavidades preexistentes. Os ninhos-armadilha podem ser produzidos com gomos de bambu, fechados em uma das extremidades pelo próprio nó, com no mínimo 0,8 cm de diâmetro. Os gomos devem ser inseridos em tubos de PVC para proteção. Depois que as fêmeas se estabelecem nos ninhos-armadilha, eles podem ser transportados para os cultivos (Sazan et al. 2014).
  • Os polinizadores também necessitam de água para satisfazerem suas necessidades fisiológicas e, no período seco, que corresponde à floração do cajueiro na região Nordeste, pode ocorrer a falta desse recurso. Nessa situação é fundamental a presença de fontes permanentes de água, como açudes, lagos ou lagoas nas proximidades dos cultivos para os polinizadores.

A pulverização de defensivos agrícolas deve ser evitada no período de floração, mas se o tratamento fitossanitário for indispensável para evitar danos econômicos na plantação, cuidados especiais devem ser adotados para não atingir as abelhas, como dar preferência a técnicas agronômicas de Manejo Integrado de Pragas (MIP).

A pulverização deve ser realizada com produtos de baixa toxicidade para as abelhas, ao final da tarde ou pela noite, quando elas não estão em atividade no campo. Foi observado que diferentes espécies de insetos visitam as flores do cajueiro ao longo de todo o dia, porém o pico de atividade ocorre até às 15h, dependendo do visitante floral. A abelha-africanizada, por exemplo, apresenta maior frequência de visitação entre 9h e 12h (Freitas e Paxton 1996).

É essencial seguir todas as recomendações presentes nos rótulos e bulas, observando rigorosamente as boas práticas de tecnologia de aplicação dos produtos, incluindo medidas para evitar a deriva (porção do defensivo aplicado que não atinge o alvo desejado).

Texto produzido pela Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A.), em colaboração com a Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (ABRAFRUTAS).

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Referências

Alves-dos-Santos I et al. (2007) História natural das abelhas coletoras de óleo. Oecologia brasiliensis 11, 544-557.

Comex Stat – Sistema de Análise das Informações de Comércio Exterior da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) (2019) Disponível em: http://comexstat.mdic.gov.br/pt/home. Acesso em: 20 set 2021.

Freitas BM (1994) Beekeeping and Cashew in North-Eastern Brazil: The Balance of Honey and Nut Production. Bee World 75, 160-168.

Freitas BM e Paxton RJ (1996) The role of wind and insects in cashew (Anacardium occidentale) pollination in NE Brazil. The Journal of Agricultural Science 126, 319-326.

Freitas BM e Paxton RJ (1998) A comparison of two pollinators: the introduced honey bee Apis mellifera and an indigenous bee Centris tarsata on cashew Anacardium occidentale in its native range of NE Brazil. Journal of Applied Ecology 35, 109-21.

Freitas BM et al. (2014a) Plano de manejo para polinização da cultura do cajueiro: conservação e manejo de polinizadores para agricultura sustentável, através de uma abordagem ecossistêmica. Rio de Janeiro, RJ: Funbio.

Freitas et al. (2014b) Forest remnants enhance wild pollinator visits to cashew flowers and mitigate pollination deficit in NE Brazil. Journal of Pollination Ecology 12, 22-30.

Giannini TC et al. (2015) The Dependence of Crops for Pollinators and the Economic Value of Pollination in Brazil. Journal of Economic Entomology 108, 849-857.

Giannini TC et al. (2020) Unveiling the contribution of bee pollinators to Brazilian crops with implications for bee management. Apidologie 51, 406-421.

Holanda-Neto JP et al. (2002) Low seed/nut productivity in cashew (Anacardium occidentale): Effects of self-incompatibility and honey bee (Apis mellifera) foraging behaviour. Journal of Horticultural Science and Biotechnology 77, 226-231.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Produção Agrícola Municipal (2019) Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/9117-producao-agricola-municipal-culturas-temporarias-e-permanentes.html?=&t=sobre. Acesso em: 20 set. 2021.

Klein AM et al. (2020) A Polinização Agrícola por Insetos no Brasil. Um Guia para Fazendeiros, Agricultores, Extensionistas, Políticos e Conservacionistas. Albert-Ludwigs University Freiburg, Nature Conservation and Landscape Ecology.

Sazan MS et al. (2014) Manejo dos Polinizadores da Aceroleira. Ribeirão Preto, SP: Editora Holos.