Biodiversidade e serviços ecossistêmicos terão nova avaliação global

A Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) anunciou na 14ª Conferência das Partes (COP 14) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), que ocorre até 29 de novembro no Egito, avanços na elaboração do primeiro relatório de avaliação global sobre biodiversidade e serviços ecossistêmicos relacionados ao fornecimento de alimentos, ar puro e água limpa.

Previsto para ser lançado em maio de 2019, o relatório será o primeiro do gênero desde a publicação do Millennium Ecosystem Assessment, em 2005, por iniciativa do World Resources Institute (WRI), do Banco Mundial e dos programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP, em inglês) e para o Desenvolvimento (UNDP).

Além de ser uma nova síntese sobre o estado da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos em escala mundial e suas contribuições para o bem-estar da humanidade, a avaliação global será a primeira de caráter intergovernamental, segundo a IPBES.

“A perda de espécies, de ecossistemas e de diversidade genética já é uma ameaça global e geracional para o bem-estar humano. Proteger as inestimáveis contribuições da natureza para as pessoas será um desafio decisivo nas próximas décadas. Políticas, esforços e ações – em todos os níveis – só terão sucesso, no entanto, se forem baseados nos melhores conhecimentos e evidências disponíveis. Isso é o que a Avaliação Global da IPBES fornecerá”, disse em comunicado Robert Watson, presidente do órgão muitas vezes chamado de “IPCC para a biodiversidade”.

150 especialistas de 50 países

O relatório foi elaborado por 150 especialistas de 50 países, com uma representação equilibrada entre as ciências naturais e sociais, e teve contribuições adicionais de mais 250 especialistas que colaboram com a IPBES.

Entre os 150 especialistas que participam como autores do relatório estão os brasileiros Cristina Adams, da Universidade de São Paulo (USP); Gabriel Henrique Lui, do Ministério do Meio Ambiente; Maria Manuela Ligeti Carneiro da Cunha, da USP; Pedro Henrique Santin Brancalion, também da USP; Rafael Dias Loyola, da Universidade Federal de Goiás (UFG), Eduardo Sonnewend Brondizio, da Indiana University, nos Estados Unidos; e Bernardo Baeta Neves Strassburg, do Instituto Internacional de Sustentabilidade (ISS).

Os autores foram selecionados por meio de um processo de convocação pela IPBES para que os 130 países-membros da plataforma – além de organizações não governamentais (ONGs) credenciadas e organismos multilaterais que tratam sobre biodiversidade e serviços ecossistêmicos – indicassem especialistas para participar da elaboração do documento.

Após as indicações pelos países-membros, um painel multidisciplinar de especialistas da IPBES analisou todas as candidaturas e selecionou os indicados. Alguns dos critérios da escolha foram as qualificações dos candidatos, o estabelecimento de um balanço regional – de modo que todas as regiões do mundo estivessem representadas – e de gênero e a proposição de que, a cada 10 selecionados, oito deveriam ter sido indicados por governos e os outros dois pelas ONGs credenciadas ou pelos organismos multilaterais.

“Os relatórios elaborados pela IPBES pretendem sempre reunir o maior número possível de países. Mas acontece, às vezes, de nem todos os países-membros da plataforma indicarem seus representantes”, disse Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador do programa BIOTA-FAPESP.

Joly coordenou o Painel Multidisciplinar de Especialistas nos seus primeiros anos de existência, ao lado do australiano Mark Londsdeale, da Organização de Pesquisa Científica e Industrial da Commonwealth (CSIRO), e é membro da coordenação da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES, na sigla em inglês), cuja criação foi inspirada na IPBES.

Desenvolvida ao longo dos últimos três anos e a um custo total de mais de US$ 2,4 milhões, a Avaliação Global da IPBES é baseada em quase 15 mil referências bibliográficas, incluindo artigos científicos publicados em revistas internacionais e nacionais não somente em inglês, além de teses acadêmicas e relatórios de governo.

Segundo a IPBES, a avaliação global é a primeira a analisar e incluir conhecimentos, questões e prioridades de comunidades tradicionais e indígenas e também se baseia em seus relatórios de avaliação lançados nos últimos anos. Entre eles, estão o relatório temático sobre degradação e restauração de terras degradadas, lançado em março deste ano, e os relatórios de avaliação regional para África, Américas, Ásia-Pacífico e Europa e Ásia Central.

Políticas Públicas e ODS

“O relatório global não será uma simples somatória dos relatórios regionais porque tratará de questões mundiais, como os impactos do comércio e outros processos globais sobre a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos e os impactos das mudanças climáticas, de espécies invasoras, da poluição e de mudanças no uso da terra e do mar em diferentes ecossistemas”, disse Joly à Agência FAPESP.

A avaliação abrange todos os ecossistemas terrestres – exceto a Antártica –, águas interiores e oceanos abertos e avalia as mudanças na biodiversidade e nos ecossistemas nos últimos 50 anos e suas implicações na economia, meios de subsistência, segurança alimentar e qualidade de vida da população mundial. Além disso, aponta as opções políticas e os prováveis caminhos nas próximas décadas se as tendências atuais continuarem.

A expectativa da IPBES é que o relatório sirva de base para formular políticas públicas melhores e estimular ações mais efetivas por parte dos governos nas próximas décadas e que ajude a avaliar o progresso dos países em relação aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), as Metas de Biodiversidade de Aichi e o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas.

Na próxima Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-CDB), prevista para ocorrer em 2020, por exemplo, os países terão que demonstrar seu progresso na consecução de medidas para deter a perda da biodiversidade, como estabelecido nas chamadas Metas de Aichi.

“Boa parte dos dados que serão usados pelos países para essa finalidade será tirada dos diagnósticos regionais e do global elaborados pela IPBES”, disse Joly.

“Os dados gerados pela avaliação global e os relatórios gerados pela IPBES serão complementares aos produzidos pelos relatórios nacionais que os países que são signatários da CDB, mas que ainda não são membros da IPBES, terão que elaborar”, disse.

O relatório de avaliação global será finalizado e apresentado na sétima sessão plenária da IPBES, prevista para ocorrer de 29 de abril a 4 de maio de 2019 em Paris, na França, quando os representantes dos 130 países-membros do órgão irão se reunir para discutir e aprová-lo.

Na ocasião também será lançado um resumo detalhado do relatório, voltado para formuladores de políticas públicas, destacando as principais conclusões do documento.

Fonte: Agência FAPESP – Elton Alisson